Kamala Harris praticamente apagou a liderança de Donald Trump nas pesquisas nos sete estados decisivos dos Estados Unidos, o que é um testemunho da empolgação gerada por sua entrada tardia na corrida presidencial. Esta semana, sua campanha acelerou em cada um desses campos de batalha.
O alvoroço começou em 6 de agosto em um comício na Filadélfia, Pensilvânia, o mais crucial dos estados decisivos, onde ela apresentou Tim Walz, governador de Minnesota, como seu companheiro de chapa. De lá, os dois deveriam realizar comícios nos outros seis estados: Wisconsin, Michigan, Carolina do Norte, Geórgia, Arizona e Nevada.
Em sua primeira aparição conjunta, ela e Walz repetiram seus avisos de que Trump quer proibir o aborto, é uma ameaça à democracia e se preocupa apenas com os ricos. Subjacente a tudo isso estava outra mensagem —de que a economia americana é a mais forte do mundo e que o país continua sendo um lugar onde as pessoas que trabalham duro prosperam.
“Lutamos por um futuro onde construímos uma economia ampla, onde todo americano tem a oportunidade de possuir uma casa, iniciar um negócio e construir riqueza”, disse Harris a uma multidão entusiasmada de apoiadores na Filadélfia.
A apenas 80 km do comício, está uma cidade onde essa mensagem otimista soa verdadeira. Bethlehem foi imortalizada em 1982 por Billy Joel em “Allentown”, uma música sobre o declínio industrial da Pensilvânia. A carcaça enferrujada da Bethlehem Steel, outrora sua principal empresa, ainda domina o horizonte. Hoje, porém, é um cenário atmosférico para festivais de música, outlets e um cassino.
A taxa de desemprego na área era de apenas 3,6% em junho, um pouco acima de seu nível mais baixo em décadas e meio ponto a menos que a média nacional. O que torna a cidade fascinante é como ela se encaixa na política nacional. Está localizada em um condado, Northampton, que serve de termômetro para o estado: a maioria dos eleitores apoiou Barack Obama em 2008 e 2012 antes de desertar para Donald Trump em 2016 e retornar para Joe Biden em 2020.
No entanto, Bethlehem também mostra por que Harris terá dificuldades para fazer campanha com base na força da economia. Embora empregos abundantes e salários crescentes normalmente impulsionassem um candidato, nos últimos dois anos as pesquisas mostraram que os americanos estão desanimados com a economia. Os democratas têm tentado superar isso promovendo o desenvolvimento em todo o país, e em Northampton eles têm muito a que se basear.
Em janeiro, Biden visitou Allentown para destacar como a economia estava indo bem. A área incorporou mais de 30 mil empregos desde sua eleição. Os salários reais começaram a aumentar desde antes da pandemia de covid-19. A manufatura está realmente retornando: os investimentos locais incluem US$ 500 milhões em instalações de embalagem e US$ 7,5 milhões em uma fábrica de garrafas.
Josh Shapiro, governador democrata do estado que estava na lista de finalistas de Harris na busca por um vice-presidente, também é visitante regular da área. Em 16 de julho, ele ficou em frente a um prédio de escritórios de tijolos que antes pertencia à Bethlehem Steel para a cerimônia de assinatura do orçamento estadual.
Em janeiro ele também esteva na cidade para lançar uma estratégia econômica, e tem uma boa história para contar: o salário médio por hora do estado é quase um dólar acima da média nacional, assim como era em 1979, antes do colapso da indústria siderúrgica, de acordo com o think-thank Keystone Research Centre. A economia ajuda a explicar a popularidade de Shapiro. Cerca de 50% dos habitantes do estado aprovam seu desempenho, contra apenas 35% que desaprovam.
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O otimismo não se estende à gestão da economia pela Casa Branca. As pesquisas deram notas baixas a Biden, com mais confiança depositada em Trump para assuntos econômicos. Harris está se saindo melhor do que seu chefe, mas está começando em um buraco. Uma explicação é a inflação, que os eleitores, com razão, veem como mais um problema nacional do que local. A inflação esfriou recentemente, mas os preços ainda subiram cerca de 20% desde que Biden assumiu o cargo.
É algo que as pessoas sentem em todos os lugares, diz Wayne Milford, dono da cervejaria artesanal e restaurante Birthright Brewing, em Nazareth, cidade próxima a Bethlehem. “Estou tendo que pagar a mais os funcionários apenas para mantê-los trabalhando”, diz ele.
Os custos também dispararam para ingredientes —farinha, tomate, carne bovina, carne suína e asas de frango. Ele tem menos clientes e, os que vão ao restaurante, gastam menos. Isso pode parecer inconsistente com os números resilientes de consumo em nível nacional. Mas os restaurantes revelam que nem tudo está bem: na primeira metade deste ano, os gastos com refeições fora de casa mal aumentaram, crescendo no ritmo mais lento desde o início da pandemia.
A política de Northampton é moderada. Mais casas exibem bandeiras americanas do que sinais de qualquer candidato. Ainda assim, as lealdades partidárias são profundas. Em uma loja de ferragens, a proprietária, Barbara Werkheiser, cumprimenta uma corrente de clientes, ajudando-os educadamente a encontrar tintas, válvulas e ferramentas. Mas se perguntar a ela, uma republicana, sobre a economia, o clima desanima.
“Não vejo crescimento. Vejo dificuldade, problemas na cadeia de suprimentos, custos mais altos para produtos e que é difícil conseguir ajuda confiável”, diz ela, que está convencida de que as coisas seriam melhores sob Trump. “Ele pode ser um idiota, mas era um idiota que fazia as coisas acontecerem”, diz.
O partidarismo se tornou uma variável crucial nas últimas duas décadas. Os eleitores republicanos são mais otimistas sobre a economia quando um republicano está na Casa Branca, assim como os democratas são mais positivos quando um dos seus é presidente. Esse raciocínio garante eleições acirradas em qualquer estado onde a população esteja dividida equilibradamente entre os dois partidos.
Em relação a Harris, há uma frustração extra. Em teoria, ela tem um histórico razoável para se candidatar, com Biden assinando grandes programas de gastos para veículos elétricos, infraestrutura e semicondutores. Na prática, levará um tempo até que os residentes percebam os resultados.
Por exemplo, o primeiro grande lote de financiamento para fábricas de carros elétricos na região foi anunciado há algumas semanas, quando o governo deu à Volvo mais de US$ 200 milhões para expandir a produção em instalações, incluindo uma fábrica de caminhões. O posto de controle no aeroporto local, Lehigh Valley International, foi modernizado com uma doação federal de US$ 5 milhões.
Mas um projeto maior —US$ 40 milhões para um novo centro de logística e carga— foi aprovado apenas no início deste ano. “Acho que é um pouco cedo para falar sobre o impacto real”, diz Nicole Radzievich Mertz, da Lehigh Valley Economic Development Corporation.
Cada estado tem suas idiossincrasias, e na Pensilvânia uma delas é a tensão entre a produção de energia e a proteção ambiental. Um boom do fracking (ou fraturamento hidráulico, técnica que usa água com areia e químicos para quebrar rochas profundas e extrair gás) tornou a Pensilvânia o segundo maior estado produtor de gás dos EUA.
Em sua fracassada candidatura nas primárias democratas em 2020, Harris pediu a proibição do fracking, eTrump está usando isso como munição. Mas em pesquisas, cerca de metade dos residentes do estado se opõem à técnica por motivos ambientais. Agora, Harris recuou de seus pedidos de proibição e parece apoiar a continuação da prática com regras mais rígidas —basicamente a mesma posição de Shapiro.
Em Northampton, a 160 km da intensa atividade de fracking, isso provavelmente está mais próximo da visão mediana do que do mantra “perfure, baby, perfure” de Trump. Isso pode ajudar Harris a compensar os votos que ela certamente perderá nas partes ricas em gás do estado.
Em ascensão
Em relação à grande questão —qual candidato é melhor para empregos e crescimento— Northampton também tem uma visão do por que a força recente não é um argumento decisivo para Harris.
Folha Mercado
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Simplificando, a economia americana tem se saído bem, independentemente de quem ocupa a Casa Branca. Biden falou sobre Northampton como se fosse uma comunidade enferrujada e quebrada antes de assumir o cargo. Mas, na verdade, o local está em trajetória ascendente há um tempo.
A taxa de desemprego na área de Bethlehem caiu durante a maior parte da presidência de Obama e de Trump, e caiu ainda mais sob Biden à medida que a pandemia diminuiu. As rendas familiares aumentaram, subindo cerca de 20% em termos reais na última década.
Os políticos adoram a manufatura. No entanto, a verdadeira força de Northampton reside em sua diversificação. Durante os dias de glória da Bethlehem Steel, a manufatura representava cerca de um quinto dos empregos; agora, nenhuma indústria individual representa mais de 11%. A menos de duas horas de carro de Nova York e Filadélfia, o local também se transformou em um centro logístico.
Juntamente com boas escolas, centros urbanos bonitos e habitação acessível, Bethlehem e suas cidades vizinhas atraíram novos moradores. Nos últimos cinco anos, sua população aumentou 4%, enquanto o resto da Pensilvânia cresceu apenas1%.
Muitas empresas locais também estão crescendo. Michael Woodland, proprietário de uma franquia de sinalização, vê um corte transversal da economia de Northampton em seus contratos com hospitais, equipes esportivas, o aeroporto e outros.
A demanda tem sido tão robusta que ele recentemente comprou um novo prédio de quase 930 metros quadrados de espaço. “Moderamos algumas das nossas atividades nos últimos anos porque os especialistas diziam que uma recessão estava chegando. Bem, ela não veio, e continuamos ficando mais ocupados”, diz ele.
Para ele, as principais questões na eleição são pessoais e culturais, em vez de coisas que afetarão os negócios. O único risco que o preocupa é a violência desencadeada pela eleição. “A menos que seja completamente catastrófico, os negócios continuarão avançando”, diz ele.
A política pode oscilar; a economia permanece estável.
Texto de The Economist, traduzido por Helena Schuster, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com.