Eu te entendo, Pablo Marçal. Se eu ganhasse a vida enganando otário e visse Bolsonaro (PL) sendo eleito em 2018, concluiria o mesmo que você concluiu: subestimei o tamanho do meu mercado.
Apostando no peso eleitoral do segmento otário da população, Marçal lançou-se candidato a prefeito de São Paulo. No último Datafolha, empatou tecnicamente com Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), numericamente à frente do atual prefeito.
Foi como se gritassem “Xandão chegou!” no bordel bolsonarista. Jair correu para um lado dizendo que Marçal não tem caráter. Eduardo correu para o outro lembrando que Marçal dizia que Lula e Bolsonaro eram a mesma coisa. Carluxo se trancou no banheiro e declarou apoio à candidata do Partido Novo porque não entendeu exatamente quais eram as opções.
Nikolas Ferreira, mais jovem, teve medo de ofender o golpista com maior expectativa de vida e anunciou que não faria campanha para ninguém em São Paulo esse ano. Marçal xingou Carluxo de “retardado”, pediu de volta o dinheiro que deu para Bolsonaro na campanha passada, mas continua dizendo que apoia o Jair.
O crescimento de Marçal é um problema para Bolsonaro. Seu principal objetivo nesta eleição é conseguir que gente do centrão (como Ricardo Nunes) lhe deva favores. Jair precisa do centrão para aprovar sua anistia no Congresso.
Marçal tem mais seguidores nas redes sociais que Nunes, mas o Congresso se parece muito mais com Nunes do que com Marçal. É no TikTok de Brasília que Jair precisa rebolar.
Por isso, Bolsonaro está trabalhando nesta campanha mais do que trabalhou em qualquer coisa antes, durante ou depois de sua Presidência. Se essa jogada der errado, ele tem mais chance de ser preso.
Mas se os políticos do centrão descobrirem que Bolsonaro não entrega os votos de seu eleitorado, o valor de Jair como aliado cai a zero. Afinal, quem vai querer um aliado que lhe transfira seus inimigos, mas não seus aliados?
O eleitorado de extrema direita tem razão em se sentir confuso.
Sempre que você assistir a uma declaração de apoio de Bolsonaro a Nunes, preste atenção em sua linguagem corporal. Ela diz: “Por favor, votem nesta porcaria aqui porque é a turma dele no centrão que pode me livrar de ser preso por ter matado pelo menos 100 mil pessoas na pandemia e tentado um golpe de Estado. Sim, eu sei que vocês preferiam votar naquela outra porcaria ali. Mas peço que votem nesta daqui, como prova de lealdade a uma porcaria ainda maior, que no caso sou eu”.
Ninguém precisa sentir pena de Ricardo Nunes. Quem chamou os extremistas para dançar foi ele. Negou que o 8 de janeiro tenha sido uma tentativa de golpe, encontrou-se com a extrema direita italiana, só faltou dar cloroquina para a ema. Perdeu sua honra e talvez ainda perca a eleição.
Marçal diz que o eleitorado de direita vota nele porque não é gado, porque não tem lealdade cega a nenhum líder, nem mesmo Bolsonaro.
Na verdade, a guerra civil na extrema direita prova que há riscos em recrutar seus eleitores apenas por estímulos emocionais de curto prazo, por choques de adrenalina causados por ofensas e grosserias, por reflexos de autodefesa diante de ameaças imaginárias. Deu certo para Bolsonaro até aparecer alguém com ainda mais disposição do que ele para mentir, para ofender, para chocar pela baixeza.
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