Para Charles Duhigg, é como se escrever best-sellers tivesse virado um hábito. Jornalista vencedor do Pulitzer, ele garantiu um lugar na lista de mais vendidos do jornal The New York Times para os três livros que publicou.
Sua obra de estreia, “O Poder do Hábito”, vendeu mais de 1 milhão de exemplares só no Brasil, tornando-se presença constante nas vitrines das livrarias desde seu lançamento, em 2012. Em seu novo livro, “Supercomunicadores”, o autor pretende encontrar a fórmula por trás da comunicação eficaz.
Fato é que o mercado literário brasileiro está saturado de livros que prometem desvelar “os segredos da produtividade na vida e nos negócios”, como anuncia Duhigg na capa de “Mais Rápido e Melhor”. Só em 2023, os livros de autoajuda somaram mais de 7,5 milhões de exemplares publicados no Brasil, segundo monitoramento da consultoria Nielsen.
No meio dessa enxurrada de livros que reiteram o senso comum, no entanto, os livros de Duhigg se destacam. As capas das edições publicadas pela Objetiva podem não atrair o leitor mais intelectualizado, mas, superado o preconceito em relação à prateleira de autoajuda, é uma leitura prazerosa.
Afinal, as credenciais do autor sustentam sua capacidade literária: formado em Harvard e Yale, ele liderou a equipe de jornalistas do New York Times premiada em 2013 por “The iEconomy”, uma série de reportagens que examinou a economia global sob a perspectiva da Apple.
Jornalista investigativo na revista New Yorker, Duhigg aposta que o segredo por trás do seu sucesso está na ciência que sustenta sua obra.
“Os meus livros são muito mais um testemunho do trabalho que outros fizeram do que qualquer coisa que eu tenha descoberto. Tenho a oportunidade de me apoiar nos ombros de gigantes o tempo todo”, diz o autor, enquanto acaba de almoçar durante entrevista por vídeo à Folha. Ele se refere às centenas de entrevistas e estudos mobilizados no decorrer das quase cem páginas de notas que aparecem ao fim de “O Poder do Hábito”.
É sua habilidade de Duhigg de contar histórias que dá vida aos achados científicos. O trabalho começa como investigação: ao visitar laboratórios e conversar com pesquisadores, ele pergunta: “Qual é a história sobre o seu trabalho que você conta quando está tomando uma cerveja com os amigos?”
Daí surgem as narrativas inusitadas que ilustram seus livros. Como os americanos incorporaram a pasta de dente em suas rotinas? Como a Nasa escolhe astronautas? Como uma falha de comunicação causou um incêndio que matou mais de 30 pessoas no metrô de Londres? Como Rosa Parks e Martin Luther King Jr. conseguiram alavancar o movimento pelos direitos civis?
Essas são algumas das histórias que ele explora, em tom de suspense, para convencer o leitor de que tomar o controle sobre sua própria vida é possível.
Mas os livros de Duhigg não deixam de replicar os modos da autoajuda que incomodam os leitores aversos ao gênero: servem como manuais práticos de sobrevivência no capitalismo. Entre cada boa história e fato científico interessante, infográficos simplificam o que está escrito, e as seções que pretendem servir de “guia” interrompem a fluidez literária das narrativas.
Mesmo assim, o tom do autor não se iguala às falas dos coaches que se multiplicam nas redes sociais. Formado na escola de negócios da Universidade de Harvard, ele assume: “eu amo o mundo dos negócios”. Mas a verdade é que ele rapidamente fugiu do meio para poder investigá-lo de longe, como repórter.
Logo que terminou sua formação, em 2003, aplicou para vagas de trabalho nas grandes firmas do mercado imobiliário, sem sucesso. De volta à sua cidade natal, no Novo México, pensou em se dedicar à política, mas logo conseguiu um emprego como repórter no Los Angeles Times, e vem se dedicando a denunciar os problemas do mercado desde então.
Essa trajetória lhe rendeu o entendimento de que não basta insistir no sucesso individual sem levar em conta as relações interpessoais. Se “O Poder do Hábito” e “Mais Rápido e Melhor” focam no indivíduo, “Supercomunicadores” entende que a maior parte da vida se dá em convívio.
“Percebi que deixei uma grande parte dessa conversa de fora ao não focar a comunicação. Por isso, o novo livro mira em como criar conexões com outras pessoas. Meu objetivo era ajudar as pessoas a entenderem como se tornar parte do coletivo, como contribuir para o coletivo de uma maneira que pareça real e significativa.”
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O autor finaliza o seu primeiro livro com uma citação do americano David Foster Wallace, autor de “Graça Infinita”. Pode parecer contraditório incluir as palavras de um autor de vanguarda tão averso aos clichês ao fim de um best-seller de autoajuda, mas, no caso de Duhigg, não é.
Seus livros transformam as ciências do comportamento em uma experiência eletrizante de leitura, capaz de “desencorajar-nos de operar nas configurações padrão”, nas palavras de Foster Wallace. Talvez baste ao leitor sair do automático para poder extrair significado —e, por que não, diversão— de livros que não lhe chamariam a atenção julgando pela capa.
“No fim das contas, nós amamos histórias. Quando essas histórias são divertidas de ler e nos ensinam algo, parece que é um uso valioso do nosso tempo. É isso que tento fazer: ajudar as pessoas a se tornarem versões melhores de si mesmas enquanto se divertem.”