A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que a conta de luz em setembro vai ficar bem mais cara, por conta da cobrança da bandeira tarifária vermelha. Isso reflete a perspectiva de que tenhamos o menor volume de chuvas para meses de setembro desde 1931.
No Brasil, mais da metade da geração de eletricidade vem das hidrelétricas. Esse percentual já foi bem maior, de quase 90% antes do racionamento de 2001 e de cerca de 65% há dez anos. Mas ainda dependemos muito mais de “são Pedro” do que a média mundial (cerca de 16%).
Embora a geração por fontes eólicas e fotovoltaicas tenha se elevado expressivamente no Brasil, respondendo hoje por mais de 20% da produção, elas são intermitentes e sua energia não é armazenável (ao menos com a infraestrutura atual). Assim, quando há escassez de chuvas, temos que acionar as caras e poluentes termelétricas, com esse custo sendo repassado para os consumidores.
Esse quadro não é exatamente uma novidade: eu venho apontando desde 2021, em diversos textos no blog do FGV Ibre e na imprensa, que o Brasil vem passando por uma estiagem crônica e severa desde 2012. Não à toa, quase tivemos que adotar racionamentos em 2014, 2017 e 2021 (neste último caso, foi por um triz).
As repercussões negativas não se limitam à geração de eletricidade (insumo essencial nos processos produtivos). A produtividade da agropecuária, que cresceu cerca de 4% ao ano entre 1970 e 2011, avançou apenas 1,5% a.a. no período 2012-2021, segundo estimativas de produtividade total dos fatores do Ipea.
Não fosse a expressiva alta de preços internacionais das commodities agrícolas em 2020-22 e a mudança de patamar do R$/US$ após a pandemia (de menos de R$ 4,00 para algo entre R$ 5,00 e R$ 5,50), a renda agropecuária teria sofrido bastante nos últimos anos, gerando transbordamentos negativos sobre o restante da economia brasileira, já que o agronegócio equivale a cerca de 25% de nosso PIB.
Eu estimei que a anomalia de chuvas no Brasil desde 2012 subtraiu algo entre 0,8 e 1,6 ponto percentual ao ano do crescimento de nosso PIB —valor que encontra respaldo em diversas estimativas de estudos recentes publicados na Nature e pelo Banco Mundial.
A despeito desses seguidos alertas, boa parte dos analistas econômicos segue menosprezando esses efeitos negativos decorrentes da redução de oferta desse importante serviço ecossistêmico.
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É altamente provável que essa estiagem crônica no Brasil esteja associada sobretudo ao desflorestamento acumulado na região da floresta amazônica (equivalente à área do Chile nos últimos 40 anos), afetando negativamente as chuvas no centro-sul do país por conta do fenômeno dos “rios voadores”.
Como lidar com isso? Investindo em mitigação (zerar o desmatamento e regenerar a floresta amazônica e mesmo outros biomas) e aceleração da adaptação (criação de sistemas de armazenagem de energia, aumento da irrigação, entre outras). O “mercado” vai resolver isso sozinho? No tempo necessário? Acho que não. Por isso precisamos de políticas públicas para impulsionar essas medidas.
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